26/06/2010

Fooooom!


“O homem nasceu livre e por toda a parte vive acorrentado”.
Rousseau



Fooooom! Fom fooooom! Bibiii! Eu tava muito feliz, acordei tão feliz! Hihihi... Papai hoje vai me levar pra passear no carro dele. Mamãe também vai, tomara que ela não fique me enchendo dizendo assim: pára com isso, filha! Você já foi longe demais! Aquela chata, eu nem posso sair do quarteirão! Eu acordei e eu pulei logo na cama, gritei: acorda! Acorda! O senhor disse que ia me levar pra passear hoje! Nem tá chovendo, tá um sol beeem grandão, pai! Levanta! Êêê!

Eu di um beijo nele e fui me arrumar. Tomei banho, coloquei maquiagem. Que é isso, menina! Vai tirar esse batom da cara, vai! Mamãe é um saco, não deixa ninguém fazer nada... Calma, meu amor, ela só está brincando! Papai me adora, mamãe é chata. Aí eu fui me arrumar, coloquei um vestidinho verde que eu ganhei e fui tomar café. Aí eu comi tanto que eu ia explodindo! Hihihi... Queijo, presunto, um pãozãozão assim, ó! Mamãe já tava olhando feio de novo. Você não pode comer tudo isso! Vai passar mal! Ah!

Papai nunca tinha tempo de me levar pra nenhum lugar. Tô tão feliz! Foooom! Bibiii! Pára com essa buzina, Clara Emília! Agora! Eu di outra buzinada e fiquei esperando papai chegar no carro. Mamãe já se enrolou no cinto no banco dela. Cadê o papai? Foi buscar umas coisas que ele esqueceu, não é da sua conta. Senta no banco de trás! Bibiii! Ele já vem! Êêê... Vamo passear! Vamo passear!

Aí papai ligou o carro e aí a gente foi pra estrada, pulando no banco de trás. Mamãe chata me mandando por o cinto. Olhei pelo vrido do carro pras plantas, cada árvore linda, um montão de vaca comendo capim... Por que a gente mata tanta vaca, mamãe? Ela é tão bonitinha... Deixa de besteira e olha pra frente! Aí eu olhava pra frente e eu tentava me lembrar quando foi a última vez que a gente tinha viajado. Quando foi, papai? Você não lembra, era muito novinha, foi mamãe que respondeu. Papai, liga o som! Põe uma música beeeem animada! Não desconcentra seu pai, Clara Emília! Então buzina, papai! Acho tão engraçado... Aí mamãe me mandava calar a boca de novo.

Chata.


Fooooom! Fooooooooooooooooooooooooommmm…


A buzina não parou mais quando o carro bateu. Eu tava arranhada na perna e meu braço tava doendo um pouquinho, mas di risada! Mamãe chata, bem feito, bateu com a cabeça no vrido da frente. Tava saindo um montão de sangue, ela nem se mexia. Papai com a cabeça segurando a buzina. Fooooom… Aí ele se levantou, tava machucado na cara, mas falou comigo ainda. Eu tô bem, papai, continua com a buzina, é tão engraçada... Vem, vamos ajudar a sua mãe, ela não tá bem. O carro bateu porque a mamãe vive discutindo. Meu amor, a Clara Emília tem que aprender como é a vida, você mima demais essa menina! Mamãe é chata, prefiro papai. Aí um carro passou na curva e assustou o papai e o carro bateu. E meu pai aí perguntando: por que você gosta tanto dessa buzina, querida? Deixa ela pra lá, filha! Aí eu disse que gostava porque parecia a mamãe gritando no meu ouvido. Fooooom… Bem feito pra ela.

***

Mais tarde a penumbra da sala de Sr. Jean, o diretor, cobria de leve a menina cabisbaixa, visivelmente envergonhada. O Sr. Jean sentado com um semblante bastante preocupado, usando-o para agredir Clara Emília, bem como seus pais. Onde estão os pais hoje em dia? Não adianta dizerem que isso aqui na minha mão é culpa da escola! Essa criança precisa de educação não só na escola! E o Sr. Jean gesticulava o tempo todo com a redação de Clara Emília nas mãos. Ela permanecia cabisbaixa, apenas ouvindo. Era didática para lá, técnicas pedagógicas pra cá. Senhores pais, vocês têm que contribuir para a educação de sua filha também, vocês estão criando uma víbora! Clara Emília encolheu-se ainda mais, sem ter onde esconder os ouvidos. O pai estava sério, atento, a mãe desabava em choro. Em todos estes anos como pedagogo nunca vi nada assim! Revejam a educação de sua filha! E rápido! Está certo, Sr. Jean. Está certo. Clara Emília ainda encolhida na cadeira, balançava os pés e muito disfarçadamente batia de leve na perna com a mão, deixando os lábios sussurrarem. Fooooom...


15 pitacos:

Sucesso no seu blog.a Frase de Rousseau é muito reflexiva.Acho que os nudistas se baseiam nela pra continuar com o comportamento

Nossa.. a parte da redação da emnina ficou uma narrativa perfeita! Senti como se ela mesmo estivesse contando aquilo..
O final foi o que mais me "chocou", interessante e bem comportamental!
Parabéns!

;D

Muito bom o texto, a redação realmente parece ter sido escrita por uma criança - demonstra certa ingenuidade, pureza. O final é mto legal tbm, realista, e de certa forma, bonito.

FLaemmchen

que que aconteceu com a mãe mala da clarinha???
e o pai???

Ogro, isso é importante?
Talvez uma segunda leitura o ajude a achar a resposta. ^^

retribuindo seu comentário em Prelúdio Póstumo..

"interessante..." :p

Este comentário foi removido por um administrador do blog.

eu gostei muito do post , principalmente a frase de indrodução *---*


http://www.blogescolhas.tk/

eu adorei a história ser escrita através da perspectiva da criança!!!!! muito bom ver o mundo pelos olhos infantis...

Você escreve muito bem. A narrativa é bem construída de acordo com o personagem que você desenha [como já li outros posts, me sinto à vontade para dizer isso!].

belo texto! não sei pq me lembrou uma fase da minha juventude, qnd eu era criança :P...parabéns pelo texto e pelo blog

Ahh gostei muito do texto...
só acho que deveria ter um desfecho com os acontecimentos do acidente.
*(Não liga não sou muitooo curioso)

O q diss para o Ogro serve para vc tbm, Deivid: Leia de novo e vja se isso seria util.

Wander,
esse teu texto me surpreendeu!... Esperava um outro final, hihi. Mas não estou dizendo que isso é ruim, pelo contrário. Gosto da surpresa. :)

Abs. E obrigada por seu coment no meu blog! Agradeço, inclusive, ao coment que vc fez sobre o layout, hehe. Há tempos estou querendo trocar, mas sempre vou deixando pra depois... tsc, tsc, tsc...

Tatyana França.

eu achei genial o modo como você construiu a narrativa. Viva, envolvente e empolgante o fim bem inusitado, mostrando que a maldade pode estar não só no coração de nos adultos e sim pode também habitar nos corações de crianças

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