"Ascensão e queda": romance de estreia!

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Contos de Wander Shirukaya

Para aqueles que querem conferir o que tenho escrito, dêem uma olhada aqui!

Tergiverso

Sensualidade em forma e conteúdo aguardando sua visita.

O híbrido e a arte

Animes, cinema e literatura

Procurando entrevistas?

Amanda Reznor, André Ricardo aguiar, Betomenezes... Confira estes e tantos mais entrevistados por Wander.

28/11/2011

Lançamento de "Balelas" em Goiana - PE

Amigos, é com prazer que convido todos vocês para comparecerem ao K.A.O.S., evento de música e literatura a acontecer em Goiana - PE, conforme especificado no cartaz acima. Na ocasião estarei lançando o meu livro, Balelas, no local. A apresentação dele será do poeta-amigo Philippe Wollney, do Silêncio Interrompido. Compareçam todos!

"Balelas é um livro de refinada literatura, em que a narrativa absorve diversas vozes, que, juntas, pintam um retrato sombrio de nossa sociedade. Não é uma obra simples, nem de leitura fácil, até por sua estrutura textual. São justamente as diferentes vozes que assumem o trabalho da narração e nos carregam pelas pequenas histórias, ora avançando, ora retornando, como se estivessem expressos no papel os devaneios de cada personagem. Balelas é, portanto, uma obra que provoca reflexão, que explicita as manias, os desejos mais sórdidos, as preocupações e até mesmo as loucuras de nossa sociedade - na maioria das vezes, com a predominância do ponto de vista feminino".

25/11/2011

A dança das abelhas






Sei que muita coisa que eu fiz eu não quis
Sei de muita coisa que eu quis que eu não fiz”.
Marcos Valle, “Vinte e seis anos de vida normal”.




Se soubesse que tudo ia acabar assim, teria sumido há mais tempo. Será que me acham logo? Um trago forte no cigarro se vai; interior se faz paisagem, campos brilhando em verde, sol, margaridas e dentes-de-leão. Melissa, a menina do papai, nem de longe é mais menina. Cedo ou tarde vão me encontrar. A mãe dela deve estar aflita, afoita, Melzinha do céu, onde é que você tá? Por que não perguntou antes, mãe? Aqui é minha nova família.

É muito fácil achar que isso é rito de passagem. Passagem de quê? Existem crianças assim, tão velhas? Pois saibam que a Melissa não é criança só por que deixou de trabalhar, ela bem sabe que o preço é alto por sobrevoar as pedras e buscar vôos cada vez mais amplos. Moça, por favor, não pode fumar aqui. Demorou pra alguém me encher o saco. No que atirei os restos e cinzas pela janela, a estrada se fez mais lerda. Caralho! A Mel é moça sem sorte mesmo, nem no início de nova jornada com seu rebento ela tem sorte. O ônibus no acostamento; todos descendo pra quem sabe um pouco de ar. 

Desci um pequeno morro de beleza rasteira, um ou outro espinho de planta chata picando as panturrilhas, nada perante outras picadas já levadas. Nem sinto dor. Ali sim era possível um cigarro; tremendo um pouco – nervosismo, vou ser pega? Olhando o belo corpo de três meses, desnorteio e deixo cair o maço. E a Mel despenca quando ao se abaixar pra recolher, sente o pólen das margaridas beijando seu nariz. 

E deitada entre as flores sinto o corpo formigar, olho o sol com olhos bem apertados, dia seco e sem vento me lembrando que nada é pra sempre. Minha fuga, até quando? E ela ouve a voz da mãe e do pai em línguas de choro, Mel, Melissa, cadê você, minha filha?! Tem abelhas zanzando por aqui. Elas se balançam indiferentes, eu posso ver, mesmo deitada. Duas aqui perto do meu punho, circulando uma margarida, nem sei se vagarosas ou velozes, dançam. É um chamado, não? Elas trabalham felizes, mas como ter certeza da felicidade sem sorriso? A Mel sempre sorria, mas não sabia que ela era tão infeliz, deve estar chorando a minha mãe. Sinto um espirro entalando aqui, por dentro do nariz. As abelhas. Mãe, você queria que eu fosse uma abelha, né? Operária, humilde, cuidando de flor, zangão e rainha, um mel de mulher? A Melzinha não conseguiu, prendeu-se cedo, amadureceu tarde – isso se amadureceu. A Mel quer ser abelha pra quê? Talvez repare algo, talvez conforte mais que as picadas que levei; elas não parecem reclamar, ainda por cima dançam. E dançam bem, flertam comigo, circulando as margaridas enquanto os dentes-de-leão aguardam. Não parecem reclamar. Mas por que não posso ser assim? Por que não consigo? Você não ligava e agora quer nossa ajuda, a mãe da Mel deve pensar quando ela voltar. As abelhas dançando, sol forte, olho que vê entre um matagal de cílios. Isso é a verdade, meu Deus? Ah, mãe, volto ou não? O pólen engasgando, espirro.

Me levanto um pouco tonta, andando em círculos, mas me sentindo mais leve; e a Mel sobrevoa com o olhar a paisagem, nenhum ônibus – será que foi embora? A Mel vislumbra o campo e suas flores, vento da tarde chegando, entre margaridas. A Mel deixa de manha, voando pra o trabalho.




Texto para a reunião do Clube do Conto de 07/10/2011. Tema: “pólen”.
Foto: http://stcmmrrbpp1311.files.wordpress.com/2011/10/girl-in-field.jpg

23/11/2011

Entrevistando Betomenezes


Olá, amigos  que acompanham este blog. Hoje trago para vocês mais uma entrevista. Estava ontem aqui curtindo meu 100 Broken windows do Idlewild com miojo e, nesse ínterim, entrevistei via chat o amigo e escritor Roberto Menezes. Confiramos então o que rolou desta conversa com direito a Tarantino, Emicida, Física e Literatura Paraibana. 

Wander Shirukaya - Como é de praxe, sempre peço a meus entrevistados para fazer uma breve apresentação. Fale um pouco de você.
Roberto Menezes - Meu nome é Roberto Menezes, me chame se quiser de Betomenezes. Sou paraibano de Tibiri, escrevo e sou professor universitário.

Wander - Sei que é professor de física. Como é transitar entre o mundo dos cálculos e a literatura? A sua atuação nas exatas influencia de alguma forma em sua literatura?
Betomenezes - São duas coisas completamente distintas. Na minha cabeça, coisas separadas. Porém, há coisas que considero importante para o estudo da física e a escrita: a primeira é a busca de soluções criativas para situações diversas; a segunda coisa é o uso indispensável da técnica que só se consegue com a prática.

Wander - Interessante. Então suas influências se baseiam mais na literatura mesmo. Que escritores você citaria como referência da sua prosa?
Betomenezes - Eu não colocaria esta pergunta assim. Não posso colocar nenhum escritor como referência a minha prosa, pois nunca procurei conscientemente por essa referência. O que acontece é a influência do que eu leio, do que eu escuto, do que eu vejo, vai somando à escrita sem estilo, que eu de maneira consciente vou aceitando ou não. Mas indo a sua pergunta: Stephen king foi o meu grande primeiro influenciador, José Lins e suas novelas não nordestinas, Saramago e seus últimos romances escorrendo estética. É dificil descrever nomes assim, de uma tacada só... Ronaldo Monte, André Ricardo Aguiar, Valéria Rezende, Geraldo Maciel, Dora Limeira são pessoas escrevem pra caramba.

Wander - Você está com livro na boca do forno, o Despoemas, que traz contos fortemente influenciados pela poesia. Seus romances anteriores, O gosto amargo de qualquer coisa e Pirilampos Cegos também, mas, acredito, de modo diferente. Como você vê a poesia em sua obra e qual sua relação com a poesia em si?
Betomenezes - A poesia, demorei a perceber isso, não é simplesmente um monte de versos empilhados, fazendo graça pra gringo ver. A poesia é um recurso crucial em um poema, apesar de ter muitos poemas por aí sem poesia alguma. Os meus livros, principalmente Despoemas, tentam inserir elementos usados em poemas na prosa, sem deixar se esvair o ato de contar. Há quem escreva romances como oleiro, há quem escreva como poetas. Como eu digo: tirando a poesia, o resto é olaria. 

Wander -  Despoemas também é uma compilação de adaptações. Como foi adaptar poemas de grandes escritores paraibanos? O que você acha que a boa adaptação deve conter?
Betomenezes - Eu nunca pensei realmente sobre adaptar um texto, eu simplesmente fui lendo os poemas e procurando um enredo que coubesse o poema. Era a minha interpretação dos poemas, bem mais que adaptação. 

Wander - A intersemiose entre gêneros anda cada vez mais em evidência. A que você atribui esta situação?
Betomenezes - Eu acho que é a tarantinização das artes.

Wander - Tarantinização [risos]? Tell me more!
Betomenezes - Eu acho que é a tarantinização das artes, onde a influência não se busca nas mesmas fontes... Um escritor não é feito apenas de ler clássicos, ele tem que saber o nome da mais nova sub-celebridade da semana passada, tem que saber o nome do padroeiro de Teresina, tem que saber o barato que dá a pedra de crack, tem que saber as letras das músicas que enlouquecem os marmanjos e as meninas. Quando se vai escrever, os clássicos serão sempre os clássicos, mas a maneira de dizer é outra, é um mash-up disso tudo. 

Wander - Além de lançar livro novo logo mais, você acaba de ser congratulado com o Prêmio José Lins do Rego. Fale um pouco sobre sua gratificação em receber tal prêmio e sobre o livro premiado.
Betomenezes - Fico muito feliz, ainda estou digerindo a notícia, foi um livro que me deu muito trabalho. É um livro de 70 páginas em A4 em um único parágrafo, todo em caixa baixa, escrito em segunda pessoa, bem ao estilo Caio Fernando Abreu, porém a choradeira da narradora serve para além do simples chororô, conta uma narrativa. Esta narrativa se passa em João Pessoa e entre os vários temas, aborda a política canina e ex-esposa ferina.

Wander - O que você tem lido ultimamente? Que recomendaria a quem nos lê agora?
Betomenezes - Ultimamente, 80% do que leio é de amigos que me passam textos ou coisa assim, faço parte do Clube do Conto e do CAIXA BAIXA, logo tenho material bastante para me entreter por muito tempo. Fora isso, li o último de Saramago, Caim, e vou começar a ler Levantado do Chão. Contudo confesso que não sou um leitor veloz, eu estudo muito os livros que leio. Levei 3 meses pra ler Caim, seis pra ler O Cu de Judas. Quando leio sou mais que leitor, eu releio frases inteiras pra comprovar o motivo de este cara ser tão bom, em suma, leio como escritor.

Wander - E quanto à música? Qual sua relação com ela? O que anda ouvindo e recomenda?
Betomenezes - Eu gosto muito de música. Já participei de banda e rock pra mim é a melhor coisa que tem pra descarregar as preocupações. Gosto de letras boas, mas não é uma exigência, a música vai além de letra. Mas quem escreve hoje (e não é rock) letra boa são duas pessoas Siba e Emicida.

Wander - Anteriormente você citou o Clube do Conto e o CAIXA BAIXA, dois movimentos literários paraibanos. Como você tem visto a "cena" literária da Paraíba?
Betomenezes - Eu acho que a cena literária paraibana está começando a ir além dos poetas, o Clube do Conto veio desde 2004 pra trazer a prosa com mais intensidade ao cenário paraibano. Não digo que isso não acontecia, mas não com tanta intensidade, hoje existem muitos contistas espalhados pela Paraíba inteira. Estes com influências e estilos diversos, não se restringindo a João Pessoa. O CAIXA BAIXA é um movimento de jovens escritores que se dividem entre os diversos estilos literários, geralmente executando vários, que é o que o mais interessante.

Wander - O que podemos esperar de seus projetos futuros e quais são eles?
Betomenezes - Eu tenho um cacetada de conto pronto, faltando lapidação. Um romance escrito procurando quem publique, três em construção, e um monte na fila. Espero que daqui pro final de 2019 eu tenha escrito a continuação de Crônicas de uma Morte Anunciada 2, em castellano.

Wander - Deixe uma mensagem aos leitores do blog.
Betomenezes - Que tipo de mensagem [risos]? Não leia porque dizem que é legal ler, leia o que você gosta de ler.

Wander - Obrigado
Betomenezes - De nada.



21/11/2011

Sobre "Vinho lilás"

Contos, contos e mais contos! Prova de que a "corda no pescoço", isto é, a sobrecarga de tempo, podem sim fazer bem e estimular a criatividade de alguma maneira. Conto escrito para participação na reunião do Clube do Conto desta semana, Vinho lilás é mais uma adaptação. Desta vez a canção adaptada é um clássico do cenário indie, a balada Lilac Wine, do espetacular Jeff Buckley. Sendo assim, temos a história de de alguém que chora e sofre pela confusão interna que vive. A moça aguarda o esposo para um jantar de reconciliação, o tempo passa, quando ela, já desgostosa e embrigada, se dapara com ele abrindo a porta. E agora? Bom, a música deve dar pistas do que se sucede. Então, deixo vocês com ela. Abraços.





16/11/2011

Sobre "Batucada"

A produção contística? Vai muito  bem, obrigado. Mais uma prova disso é Batucada, texto que comento um pouco a partir de agora. As minhas incursões sobre o fantástico continuam, mas, como de praxe, é preciso novas buscar novas formas de tornar a coisa mais legal e diversificada. Como comentar o narrador deste conto condicionaria demais o leitor a seguir minha linha de pensamento, mostro coisas diferentes. Temos uma garotinha, muito triste, que ao presenciar um espancamento de sua mãe por parte de seu pai, tranca-se no quarto com seu pequeno xilofone, tocando-o o mais alto possível para não ter de ouvir os gritos e pancadas. Como se vê pelo enredo, o conto é muito pesado, violento e transmite uma sensação de incômodo muito grande, uma vez que que retrata um problema muito grave de nossos dias: a violência doméstica/ familiar. Camélia, a menininha, é muito pequena e indefesa, impossibilitada de fazer algo pela mãe. o foco é mostrar a agonia dela  diante daquela rotina que, bem sabemos, não é desejada à criança alguma em nossa sociedade. Vejamos o que virá então logo mais. Bye!


13/11/2011

Steampink

Boa tarde, pessoal. Atendendo a pedidos, eis aqui meu primeiro excercício no campo da resenha/ crítica literária. Para iniciar a empreitada, discorro algumas palavras sobre Steampink, antologia de contos steampunk escritos exclusivamentes por mulheres. 
Antes de mais nada, cabe aqui explicar um pouco sobre os critérios de avaliação em que me ampararei, evitando assim uma leitura excessivamente impressionista, o que, a meu ver, não seria muito proveitosa. Ao comentar os textos a seguir, tomo como prioridade a forma (sim, sou aristotélico), isto é, que procedimentos estéticos foram utillizados pelas autoras para construir suas narrativas. Isso não implica dizer que desprezarei o conteúdo, até porque, os bons entendedores da crítica sabem que isso seria impossível, bem desastroso, já que o próprio conteúdo pode determinar a forma. Também não darei nota ao livro ou aos contos por achar isso uma medida muito determinista e rotuladora. Cabe ao leitor desta resenha interpretar o texto e levantar suas próprias especificidades a posteriori. Sendo assim, mão à obra!

Sobre o processo de edição
A Estronho é uma editora muito recente no mercado, mas que já chama muito a atenção por sua proposta de encher os olhos do leitor com livros não só aprazíveis no campo da leitura. Isso é visto com facilidade em Steampink (Belo Horizonte: Estronho, 2011). Tanto capa e diagramação estão muito bem feitas, cumprindo o papel de cativar quem se depare com ele, convidando posteriormente a ler seus 13 contos. O livro traz cuidado esmeradíssimo, inclusive no interior. Não tive dificuldades para ler, mas achei o tamanho da fonte um pouco pequeno, o que pode, acredito, causar algum entrave a quem tiver eventuais probleminhas de visão. A revisão deixou muito a desejar, infelizmente. Digo "infelizmente" por gostar e reconhecer o empenho da editora em propagar a Literatura Fantástica, mas é fato que que em absolutamente todas as narrativas percebi falhas nesse sentido, fato devidamente confirmado e comentado pela editora aqui, corroborando sua humildade em reconhecer e evoluir com seus lapsos. 
No mais, a organizadora Tatiana Ruiz pôs a mão na massa para selecionar 13 narrativas que compusessem um panorama da produção steampunk brasileira de autoria feminina. Romeu Martins, do Conselho Steampunk assinou em baixo a proposta através de seu prefácio. E quanto aos conto? Bom, vamos a eles.

Modernizando o passado

A expressão deste subtítulo cai como luva aos pressupostos da temática steampunk. Além disso, ela mostra que muitas autoras se destacaram pelo saudável caminho de remeter/dialogar/reverenciar as tradições literárias. Isso notadamente enriquece suas narrativas e abre mais possibilidades de leitura. Exemplo clássico disso é "O pena e o imperador", da Nikelen Witter, que deixa clara a influência machadiana tanto no conteúdo, já que o enredo nos apresenta um cientista reflete sobre a composição ou existência da alma humana, partindo de seus procedimentos científicos (difícil comentar sem entregar o ouro), quanto na forma, em que narra apontando leves intrusões: "É mais fácil acreditar na conversa que o Pena teve com o padre Onório e este contava sempre que tomava um cálice a mais de vinho da Eucaristia[...]" (pg. 132). Já em dois contos "primos", Ha-Mazan, da Lidia Zuin, e "Homérica Pirataria", da Dana Guedes, ambos contos retratando o mundo das nevagações audaciosas, percebi um pouco da sombra de um dos maiores capitães de todos os tempos (não, não é o Jack Sparrow, amigo: Ahab. O famoso personagem de Moby Dick é famoso por sua obsessão doentia em vencer a lendária baleia branca. De forma similar, os protagonistas dos dois contos aqui comentados agem de modo parecido. Os contos então sustentam um ar heróico, grandioso. O que muda é a forma: enquanto em "Homérica Pirataria" vemos certa reverência não só a Mellville, mas às história de pirata que lemos desde a infância, "Ha-Mazan" ousa por trazer uma tripulação totalmente composta por mulheres inescrupulosas e também por brincar com a focalização, uma vez que o leitor pode perceber que ela se aterna entre as figuras da capitã Izobelle e de sua "escudeira" Yamka. 
Se os dois contos supracitados dialogam de modo mais velado com a tradição, em "O poeta, a donzela insolente e o livro do tempo", da This Gomez, ela está escancarada em cada linha, tanto que vemos a ficcionalização de dados biográficos do mestre Álvares de Azevedo na composição da narrativa. De final muito bem arranjado, o conto também é feliz em evitar descrições exacerbadas e cansativas situando o leitor da maneira mais prgmática possível: "Itaboraí, Março de 1852" (pg. 50). A amiga (a quem já entrevistei aqui) Amanda Reznor parece ter optado pelo mesmo recurso, voltando-se apenas para uma narrativa mais suave, o que comprova seu tino para a literatura infanto-juvenil. Talvez o leitor se pergunte se os corvos mecânicos que são lubrificados com sangue de "A dama dos corvos" sejam realmente suaves. A meu ver sim, pois a violência está muito estilizada, o que a suaviza. O fato de termos corvos lubrificados com sangue em sua temática é algo inverossímil, o que contribui para a inquietação típica do texto fantástico, apenas. Além do mais, os corvos nao compoem o cerne da narrativa, que busca uma versão alternativa para o surgimento do gramofone. 
Diálogo interessante de se vertambém pode ser visto no conto da organizadora da antologia, Tatiana Ruiz. "Sem mais finais felizes" adapta uma das histórias mais adaptadas de todos os tempos, a de Chapeuzinho Vermelho, para o cenário do vapor.



Incursões estéticas interessantes


Durante a leitura de Steampink o leitor também se deparará com contos que ganham muito a partir da forma mesmo. Em "Sonha o corvo um sonho negro", da Leona Volpe, a narração faz com que uma típica história-de-amor-água-com-açúcar  se torne algo legal de acompanhar, já que o tempo todo a narração parece ser em segunda pessoa, forma narrativa arcaica e muito pouco usada, evitada, por ser considerada pouco verossímil. Entretanto, vejam que disse que parece. Na verdade a narradora dá essa impressão propositalmente: "Você voltou seus olhos negros para os meus e sorriu através deles, erguendo-se de sua poltrona vermelho-fogo, e subindo as escadarias de mármore claro [...]" (pg. 104). Vemos que há uma narradora que o tempo todo se volta para um "você", o que traz a impressão interessate de narração em segunda pessoa em boa parte do conto. Elucidar mais esse fato sem entregar o fim se torna difícil.
Em minha opinião, o melhor conto da leva "O terceiro reinado" da Georgette Sillen, tse encaixa facilmente ao que o Todorov diria ser o fantástico puro, ou seja, aquele conto que te perturba através de um evento insólito, adverso e sem resolução ao final da narrativa. As portas para a perplexidade e para a especulação se abrem nesta história ambientada no Rio de Janeiro oitocentista  e embasada em elementos políticos, que abrem mais interpretações ao conto. O final é como manda o figurino da literatura fantástica, sem dúvida prova da competência da autora. 


Nem todo vapor esquenta

Nem tudo são flores, alguns contos me passaram má  impressão, especialmente por serem excessivamente carregados. O que quero dizer com isso? Que alguns contos, tais como "A arma", da Lívia Pereira, "As irmãs taylor" da Verônica Freitas e "Escrito no tempo", da Lyra Collodel, para citar alguns, apresentam excessos tanto no conteúdo quanto na forma. No enredo isso faz com que o leitor se perca facilmente (no mau sentido) por causa da trama embolada. Isso talvez funcionaria numa narrativa mais longa, uma novela ou possível romance, onde se teria mais tempo/ espaço para destrinchar as coisas, mas se há uma coisa que o velho Poe disse e é verdade é que um conto pode até pecar pela falta, mas nunca pelo excesso. Na forma isso está bem claro, dada a quantidade de adjetivos parecidos/ repetidos que podiam ser facilmente cortados da narrativa. Talvez isso transpareça certa incipiência por parte destas autoras, fato que também não as põe como ruins, apenas não acertaram a mão desta vez. Convido o leitor a ver se tenho razão nesse sentido. 

Conclusão

Steampink trem seus defeitos, mas é indubitávelmente um bom livro, traz diferentes formas de ver um estilo que está começando a se propagar em terras tupiniquins, o que pode servir tanto de cartão de visita quanto a convite a novos escritores descobrirem seu gênero preferido. A produção do livro o faz bastante encantador, desde a sua capa. Alguns contos se apresentam como verdadeiros achados, o que trará imenso prazer ao leitor ávido por sangue novo. Fica então o convite a quem interessar, desbravem o mundo que a autoras de Steampink lhe apresentam.



11/11/2011

Sobre "Em caso de despressurização..."

Mais um conto novo para a série enveredando pelo fantástico e vertentes. Em caso de despressurização da cabine máscaras não cairão automaticamente é um conto denso, triste e, especialmente, esquisito. procurei transformar a pieguice do amor romântico em algo mais nauseante. O texto traz-nos um rapaz que vive uma intensa relação de amor com um anjo. Micaela, a criatura alada, é um ser de extrema devoção afirmando ser capaz de qualquer coisa por amor. Com base nisso, o protagonista lhe pede que ponha um fim em um sofrimento a que não temos (ou temos pouco) acesso, culminando numa catástrofe. 
É certo que o incomoda o leitor, acredito eu, seja a pouca expressão textual. Outra característica interessante é o uso de muito discurso direto, algo que raramente utillizo. Há outros recursos interessantes, mas eles estragariam a surpresa do final. 
Em breve trarei mais algum conto para este blog, já que faz tempo que não o faço. Não sei exatamente se se será o conto que comentamos agora. Esperemos o inesperado sempre, pois é bastante saudável. 


09/11/2011

Livro traz contos com personagens femininas*

por Thiago Germano

Os 16 contos que promovem a estreia de Wander Shirukaya na literatura são, em sua maioria, protagonizados por mulheres. Balelas (Mutuus, 104 páginas, R$ 28,00), livro que o autor lança hoje, às 19h, no Terraço Brasil é mais uma obra que se filia a uma tradição que, na música, encontra sua voz mais expressiva em  Chico Buarque. 
"No meu caso, a opção pelo olhar feminino é uma tentativa de explorar novas possibilidades de escrita", justifica Shirukaya, que é pós-graduando em Letras na Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e estuda a obra da escritora Lygia Fagundes Telles.
"Acredito que a literatura não tem sexo, que não existe literatura masculina ou feminina, tudo é literatura, boa ou má", pondera o contista, que é natural de São Paulo, mas já residiu nas cidades de Pedras de Fogo e Itambé, em Pernambuco, admitindo-se meio paraibano, meio pernambucano.
Shirukaya também participa do núcleo literário Caixa Baixa, grupo que aglomera jovens escritores paraibanos, do interior e da capital.


* Matéria retirada do Jornal da Paraíba de 5 de outubro de 2011, dia do lançamento de Balelas em João Pessoa.

07/11/2011

A fidelidade em debate (parte II)

Como disse anteriormente, o tema desta série de postagens é muito interessante pela polêmica que gera, visto os comentários de nosso episódio anterior, no qual até afirmaram que a literatura era uma arte superior e aceitar sua evolução mais avançada perante as outras artes era algo necessário. Bom, sigamos com mais detalhes. 
Adaptar um texto não é uma coisa muito simples, embora estejamos adaptando-os já há muitos e muitos séculos. Embora falemos muito sobre a adaptação de texto literário para texto fílmico, a de maior evidência sem dúvida, podemos adaptar tanto textos do mesmo suporte entre si (reeescrevendo contos de grandes autores, por exemplo), ou adaptando textos de seguimentos artísticos extremamente dissonantes (como seria adaptar sua canção favorita para um jogo de PS3/ Xbox 360?).  Durante nossa observações, dificulta ainda mais termos de nos apegar a três coisas: conhecimento das especificidades do texto A, do texto B e da relação criada a partir da adaptação, levantando seus pontos fracos e grandes procedimentos. Baseando-se nisso, fica muito difícil para nós nos apegarmos exacerbadamente à "fidelidade" como critério de avaliação. 
Voltando à relação clássica literatura-cinema, mostro como exemplo uma das histórias de vampiros mais belas dos últimos tempos (não, não é Crepúsculo, desgraçado leitor): trata-se de Deixa ela entrar (Let the right one in, escrito em 2004 por John Lindqvist), adaptada para o cinema tanto pelo sueco Tomas Alfredson, em 2008 (foto), quanto pelo hollywoodiano Matt Reeves em 2010. Como temos a oportunidade de observar duas versões do mesmo texto literário para o cinema, fica então mais fácil perceber as nuances estéticas de composição a que deveríamos nos ater. A saber, ambos os filmes têm forte similaridade com o texto-fonte. Entretanto, o resultado é bastante adverso. A versão sueca é mais densa, lerda, enquanto a norteamericana é mais ativa, pirotécnica e cheia de efeitos especiais. Logo, o que fica para nós, já que vemos a fidelidade aí em segundo plano, é perceber como os recursos escolhidos pelos diretores influem positivamente ou negativamente no texto de origem.
Com base nisso, o que você, amigo leitor, acha? Participe deste interessante debate. Como digo sempre, o blog é seu!


06/11/2011

Como foi o Fantástico em Pernambuco


Saudações, grandes amigos. Depois de um tempinho curto ausente, trago para vocês um relato do que rolou de mais legal no I Seminário de Literatura Fantástica de Pernambuco, ocorrido nos últimos 03 e 04 de novembro, no CAC/ CFCH da UFPE.

Ficou provado que a academia vem mesmo se importando cada vez mais com esse gênero que por muito tempo foi visto com maus olhos. Percebemos isso desde a participação de nomes de peso da crítica/ produção de litfan brasileira, a saber, Karin Volobuef, Maria Cristina Batalha e Braulio Tavares, que por longas e prazerosas horas discorreram sobre o assunto para auditórios totalmente lotados - algo realmente inesperado.
Abrindo o evento, a pesquisadora Maria Cristina Batalha, da UERJ, exibiu um panorama do fantástico no Brasil, propondo novas tipologias para este, inspiradas nas diferentes abordagens adotadas pelos autores nos últimos séculos. Tivemos também o lançamento de seu O fantástico brasileiro: contos esquecidos (Caetés/RJ), antologia reunindo narrativas que se perderam por motivos diversos, contando com a presença de grandes ícones da literatura, tais como Lima Barreto, Machado de Assis e Aluísio Azevedo.
Já Karin Volobuef brindou o público em sua palestra com detalhes da vida do homenageado do evento: E. T. A. Hoffmann, por muitos tido como o pai do fantástico. Detalhes de sua vida difícil na Alemanha, a influência do romantismo em sua obra e desta em artistas diversos que o sucederam foram explicitadas. Karin também lançou Mito e magia (Unesp/SP). Encerrando o evento, o escritor Bráulio Tavares conduziu um papo muito bem humorado sobre a ficção científica, cyberpunk e afins no país. Outro assunto debatido em detalhes foi a produção de antologias do gênero, ressaltando as dificuldades de organização, as editoras de destaque e os problemas na tradução de contos sci-fi para o português.
Como também fui soltar o verbo, cabe dizer que minha apresentação repercutiu bem, também com auditório cheio. A maior parte das comunicações apresentadas impressionou pela maturidade. Poucos foram os trabalhos que deixaram a desejar. Dentre os bons, vimos  muitos autores nacionais representados e os grandes nomes mundo afora, Borges, Cortázar, Hoffman, também foram tematizados. Chamou a atenção também uma série de trabalhos intersemióticos, como os que estudaram a influência do fantástico na música clássica, em especial em Mozart, Berlioz e Paganini, como também no cinema e nos jogos de RPG. 
Bom, detalhar tudo aqui renderia uma série muito extensa, o que talvez cansaria vocês, leitores. portanto, fiquem com a certeza que hoje é dia de litfan, bebê. Parabéns ao professor André de Sena, organizador do seminário. A arte agradece. Sigamos em frente, pois muita coisa boa ainda está por vir.


Fotos: (1) Stephen King's IT! Exposição de artes de temática fantástica no Hall do CAC/ UFPE. Infelizmente não peguei o nome do autor da tela. Se alguém souber, informe-me para que eu lhe dê os devidos créditos; (2) Karin volobuef em discurso; (3) eu e Mª Cristina Batalha;(4) mesa composta para as apresentações no auditório;(5) eu e o grande Bráulio Tavares.

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