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20/09/2010

Entrevistando Liane Schneider

Olá, pessoal. Já tinha um bom tempo que não aparecia uma entrevista aqui no blog. Para quebrar o jejum, mostro agora a conversa que tive (via e-mail) com a Profª Drª Liane Schneider, da UFPB. Vejamos então.

Wander - na condição de mulher e de pesquisadora, como você avalia a representação da figura feminina na literatura de nossos dias? Você acredita que a literatura na atualidade tem dissipado o "ar misógino" que muitas vezes esta chegou a apresentar ao longo dos anos?

Liane - eu particularmente prefiro utilizar a expressão ‘mulheres’ do que ‘figura feminina’, pelo próprio essencialismo implícito neste último termo. O que é ser feminina? Serão todas as mulheres e todas as escritoras e personagens igualmente “femininas”? Haverá necessariamente algo em comum entre todas as personagens femininas? No mesmo sentido prefiro utilizar a expressão “ literatura de mulheres” do que literatura feminina, o que trata tal autoria de forma menos pré-concebida.
Acredito que, por uma questão de temáticas abordadas, bastante marcadas pelas experiências vividas, grande parte das mulheres tende a se identificar mais com textos de outras mulheres. Por isso mesmo, não é casualidade que autoras brasileiras como Clarice Lispector, Lygia Fagundes Telles, Adélia Prado, entre outras, tenham assumido um lugar fundamental no que se refere a tal produção. A obra delas certamente ultrapassa o rótulo – ‘literatura feminina’ – até desconstruindo tal noção em muitas oportunidades. Contudo, elas falam sobre coisas que interessam a diversas mulheres (e, obviamente, alguns homens também) e, apesar de serem mais ou menos rebuscadas, conseguem manter um bom e fiel público leitor ao longo de décadas, tanto no território nacional como internacional. Talvez, porém, se não fosse a existência e desenvolvimento da crítica de cunho feminista, algumas destas obras passariam em branco, já que a crítica mais tradicional não demonstrava grande interesse inicial em garimpar novos nomes de autores e autoras provenientes de lugares e posições diferentes daquelas tradicionalmente atreladas aos intelectuais nacionais – historicamente brancos e masculinos. No que se refere à segunda pergunta, portanto, tenho certeza que, sim, as coisas mudaram e muito. O discurso é outro, o feminismo é outro, o que não quer dizer que todas as misoginias foram vencidas, mas sim, que há melhores instrumentos para se lidar com elas.

Wander - que grandes autores você citaria como recomendação aos leitores deste blog?

Liane - recomendar é tentar indicar algo não óbvio, certo? Neste sentido, eu recomendaria a leitura do que Conceição Evaristo tem escrito, que vem crescendo cada vez mais em dimensão; dentre seus poemas e romances, destacaria Ponciá Vicêncio. Aqui na Paraíba, Maria Valéria Rezende tem escrito contos e romances interessantíssimos. Nos Estados Unidos, falando muito da Índia, Jumpha Lahiri. Alguns dos outros grandes, a meu ver, são Clarice Lispector, William Faulkner (EUA), Dionne Brand (Canadá). Em teoria, Edward Said, Stuart Hall, Judith Butler.

Wander - como costumo perguntar a todos que são entrevistados, o que anda ouvindo de boa música e o que recomendaria?

Liane - gosto muito de algumas composições de Vítor Ramil, músico gaúcho que esteve em João Pessoa há poucos dias. Aliás, sua música e literatura são de grande qualidade, a meu ver.

Wander - você acredita que o ensino de literatura tem melhorado nas escolas e universidades? Que medidas você sugere para superar a grande deficiência que muitos alunos têm no que tange à leitura?

Liane - essa pergunta pode render um livro ou uma vida de estudos. Mas vá lá, vamos dar o passo inicial da minha trilha. Acho que motivar alguém que, a priori, não gosta de ler é algo dificílimo. Muitas vezes é falta de hábito e habilidade em lidar com o material. Ás vezes, ler em sala, em voz alta, é uma opção. Noutras, encenar estórias antes de lê-las. E por aí vai. Acho que ir do próximo ao distante é algo que estimula também. Permitir que relações entre contextos conhecidos e desconhecidos sejam estabelecidas, permitindo algum tipo de identificação provisória por parte dos leitores. Fui muito sucinta? O que se há de fazer, é meio estilo. Entrevistar Liane é poupar caracteres.....mas vamos à mensagem...

Wander - deixe uma mensagem para os leitores do blog.

Liane - na verdade não é minha, mas de Nathaniel Hawthorne, citada como epígrafe do livro Terra Descansada, de Jumpha Lahiri:
A natureza humana não irá vingar, não mais do que uma batata, se for plantada e replantada no mesmo solo exausto durante uma sequência demasiado longa de gerações. Meus filhos nasceram em outros lugares, e até onde eu puder controlar seus destinos, irão fincar raízes em terra descansada.
(Nathaniel Hawthorne, “The Custom-House”)

Mudanças de terreno, de ares, dar descanso ao antigo, tudo isso faz muito bem – às batatas, às pessoas, às gerações, à literatura, enfim.

Wander - obrigado.

Foto cedida pela entrevistada.

5 comentários:

  1. Eu sou um grande amante da literatura ainda que tenha por hábito fugir da crítica literária e do conhecimento cientifico sobre o ato de escrever. Por que isso? Por que acaba perdendo a magia do livro. Cada um com suas loucuras poderia dizer para me defender.

    Abs,

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  2. Belissima entrevista. Concordo com ela quando diz que motivar alguém que não gosta de ler é algo dificil. O hábito da leitura deve ser reforçado desde a infância.

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  3. e olha essa entrevista foi curtinha e bem interessante muitos outras por aqui ^^

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  4. e olha essa entrevista foi curtinha e bem interessante muitos outras por aqui ^^

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  5. e olha essa entrevista foi curtinha e bem interessante muitos outras por aqui ^^

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